CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

quinta-feira, novembro 18, 2010

Coral João Gomes Junior

Hoje, no começo da noite, o Coral João Gomes Junior receberá substancial e merecida homenagem. A festa será realizada no Instituto Cultural Brasil-Estados Unidos (Icbeu) e consta do programa o lançamento de livro de Elson Farias, a melhor música do coral e a presença de seu fundador, maestro Nivaldo Santiago.
O cinquentenário do Coral, no Teatro Amazonas
O grupo musical que já comemorou seu cinquentenário em 2006, está hoje sob a direção de Cleomar Feitoza (uma das fundadoras). A trajetória do grupo está revelada pelo acadêmico Elson Farias, no "Coral João Gomes Junior: uma aventura musical no Amazonas".
Acreditando na participção de alguma forma dessa aventura, transcrevo uma crônica do falecido padre Luiz Ruas (1931-2000), onde ele estimulava os "aventureiros", o maestro Nivaldo e convocava o povo ao Teatro Amazonas para a música.

Festival de Arte

Mais uma vez o Instituto Musical Santa Cecília vai oferecer ao público um festival de arte do Coral João Gomes Júnior. Hoje, à noite, o Teatro Amazonas estará vivendo um dos mais altos momentos artísticos de 1957. Digo isso e, à primeira vista, pode parecer com alguma coisa de semelhante à primeira qualidade das latas de manteiga. Não sei se o leitor já reparou que todas as manteigas são de primeira qualidade. (...)
Sem querer, lembrei-me agora mesmo de uma crônica que escrevi há muito tempo quando o Instituto estava sendo inaugurado, estava apenas nascendo e, no Teatro Amazonas, realizou o seu primeiro festival. Quando terminou o recital senti um alívio e uma espécie de euforia. Vi que estavam engatinhando, vi que estavam tentando caminhar, vi que um grande esforço fora feito e um esforço feito em um sentido de realizar arte autêntica.
Padre Luiz Ruas
E não tive dúvida. Na primeira oportunidade escrevi uma crônica na qual eu dizia aquilo que eu sentira. Os defeitos e as qualidades. Claro que eu falava como um simples espectador e não como crítico musical. Falava como alguém que se esforça para ver o que há de bom em tudo e ver tudo com objetividade dentro dos meus limites.
Escrevi a crônica e, confesso, tive receio de magoar, pois, até então, todas as notícias publicadas nos jornais haviam sido simplesmente elogiosas. No entanto, fazia ressalvas, tecia observações que não davam para fazer inchar muito. Pois um ou dois dias mais tarde tive oportunidade de me encontrar com o maestro Nivaldo. E ele, a primeira coisa que me disse foi:

- Li seu artigo. Foi o que li de melhor sobre a nossa apresentação.

Percebi então claramente que o maestro era alguém que estava querendo fazer coisa séria. Que ele não era um enfatuado e que tinha coragem de enfrentar uma crítica séria e construtiva. E isso é o que há de mais importante especialmente em nosso meio pequeno onde os críticos não têm boa acolhida. Ou melhor, onde a crítica está circunscrita aos confins de um punhado de elogios fáceis e rotineiros.
Pois vi logo que o maestro não era um desses que supõem que tudo aqui sai de suas entranhas é o que há de mais perfeito. É intocável. Percebi que Nivaldo Santiago estava consciente do caminho que se estende à sua frente. E que para continuá-lo está disposto a enfrentar tudo inclusive a indiferença e a apatia que nos domina aliadas a uma subcultura artística. Ou fruto dela.

Não fora isso, e o que daria crédito a este moço para apresentar o ousado programa que tenho aqui diante de mim? Se não fosse esta tomada de posição diante da arte e diante da sua arte, que coisa lhe haveria de dar forças para empreender mais esta iniciativa, a da orquestra sinfônica, a Orquestra Sinfônica do Amazonas? (...)
Agora uma coisa que pode parecer chocante: uma das finalidades deste festival é arranjar dinheiro. Dinheiro, sim. Dinheiro para fazer arte. Dinheiro para o belo. É preciso adquirir instrumentos. É preciso pagar os artistas. Compreendes, leitor?

Se não chegaste a compreender aconselho-te a ires ao Teatro Amazonas hoje à noite. E depois de ouvirdes Palestrina, Puccini, Handel, Villa Lobos ficarás convencido de que esta é, fora de qualquer roteiro de propaganda, manteiga de primeira qualidade.
O texto foi publicado em Ronda dos Fatos, em A Crítica, 23 dez. 1957. Mais de cincoenta anos depois, a festa de logo mais comprova a visão do padre Ruas.

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