CATANDO PAPÉIS & CONTANDO HISTÓRIAS

quarta-feira, agosto 03, 2011

CLUBE DA MADRUGADA: CRÔNICA

No final da semana, teremos o lançamento do livro As artes plásticas no Amazonas: o Clube da Madrugada. Será no sábado 6, a partir das 9 horas, no Espaço Cultural da Livraria Valer.
Como o Madrugada está intrinsecamente ligado ao poeta Jorge Tufic, seu condutor por décadas, vou reproduzir uma de suas crônicas tratando do CM, inserida em seu recente trabalho: O sonho de Tibério, já a venda nas livrarias 

Os momentos supremos
(...) O Clube da Madrugada, em Manaus, foi, a nosso ver, a mais eclética forja cultural inspirada pelas mais variadas tendências, com o maior número possível de intelectuais e poetas capazes de se estrear na literatura, como poucos o fizeram. Mas o CM não era só de literatura. Nas artes plásticas tivemos um Afrânio Castro, também poeta, falecido prematuramente antes de publicado. Hanneman Bacelar, muito mais novo que Afrânio, teria a má sorte de vergar ao peso cósmico dos "trópicos tristes", cometendo suicídio. A galáxia madrugada, enfraquecida agora pela dispersão voluntária dos seus componentes, vai-se deste modo resumir-se naqueles raros que ainda restam de um encontro "histórico" de que jamais se tivera notícia.

Newton Sabbá, Jayme Pereira e Jorge Tufic (de pé), 1983
Algumas outras personagens desse tempo, naquela obscura capital amazonense dos anos 50, teriam ficado também na memória de seus contemporâneos, não exatamente pela autoria de um romance, de um conto, a exemplo de A Porta-Estandarte, de Aníbal Machado, ou de um soneto-estalo, como podemos ainda mencionar Augusto dos Anjos, com Vandalismo ou Raul de Leoni, com Eugenia, mas, a rigor, no que elas foram dentro do real desempenho cotidiano de suas próprias vidas.
Temos, assim, as figuras lendárias de José Trindade, um dos fundadores do Clube, e a do filósofo Malaquias, de quem já tratamos numa crônica do Tio José (1975). Deixaram, quanto muito, a fama de seus atos públicos notoriamente rebeldes, e frases como esta do pensador da Praça do Ginásio: a senectude é como o sol do entardecer: ilumina, mas não aquece. Ou esta: não me façam vomitar dizendo "meus sonhos". Ninguém é proprietário de sonhos.

O Dr. José Trindade foi mais longe, materializando no ato físico a ideia do fantástico. Na qualidade de auditor de guerra da Polícia Militar do Estado, envergara ele, num certo princípio de noite, a luxuosa farda nobre da Corporação, com espada e tudo, indo sentar-se a uma das mesas do Bar Moderno, ao lado do Cine Polyteama. E ali, erguendo-se apenas para ir ao banheiro, tomou o porre federal mais célebre da província.

Malaquias, não tendo residência fixa, acabou por escolher o toldo de uma lancha-motor, no qual passara a dormir. Ninguém mais soube dele. José Trindade, destituído do cargo de auditor, foi tentar a sorte em Vitória do Espírito Santo, e, quanto a nós, nunca mais tivemos notícias do amigo.

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